O meio de conhecer o seu verdadeiro caráter

II Co 13:5 – “Examinai a vocês mesmos para ver se estão na fé; provem a vocês mesmos”

Ao falar deste texto penso seguir a seguinte ordem:

I. Mostrar o que implica o mandamento deste texto.

II. A necessidade deste mandato.

III. A praticabilidade deste mandato.

IV. Dar algumas indicações a respeito da forma de executar este dever.

I. Vou mostrar o que significa o mandato do texto: << Examinai a vocês mesmos para ver se estão na fé; provem a vocês mesmos>>.

Requer que entendamos nossos próprios corações, que demos os passos apropriados para assegurarmos do nosso caráter real, tal como aparece à vista de Deus. Não se refere a uma prova de nossa força, nosso conhecimento, e sim de nosso caráter moral, que deveríamos provar de modo consciente, a fim de entender como está. Implica que deveríamos saber como Deus nos vê, o que pensa de nós e se nos considera santos ou pecadores. Não é nada menos que uma ordem positiva que averigüemos qual é o nosso verdadeiro caráter, e decidamos definitivamente a coisa por nossa conta, se somos santos ou pecadores, herdeiros do céu ou herdeiros do inferno.

II. Vou mostrar a necessidade deste requerimento.

1. É indispensável para nossa paz interior que provemos e averigüemos nosso verdadeiro caráter tal como é diante da vista de Deus.

O indivíduo que não está seguro de seu verdadeiro caráter não pode ter paz interior. Pode estar indiferente ou apático, em maior ou menor grau, porém a indiferença é bastante diferente da paz. E alguns dos que professam religião, ou pessoas que seguem ouvindo o evangelho, podem chegar a esta apatia ou indiferença ao dado do tempo, até o ponto de suprimir todos os sentimentos de desgosto e insegurança com respeito ao seu verdadeiro caráter e destino. Não estou falando de hipócritas, que têm suas consciências cauterizadas, ou os debochantes, que têm se apartado totalmente de Deus. Porém quanto aos outros, é estritamente verdadeiro que podem dar resposta a essa pergunta a fim de gozarem da paz interior.

2. É essencial à sinceridade cristã.

Um homem cuja mente não clareou qual é seu verdadeiro caráter não pode dizer que seja sincero quanto à religião. Se declara ser religioso quando não sabe de veras se é um santo, como pode dizer que seja exatamente sincero? É meio hipócrita em seu coração. Assim que, quando ora, está meio em dúvida sobre suas orações, se são aceitáveis por proceder de um filho de Deus.

3. Um conhecimento justo do próprio caráter é indispensável para ser útil.

Se uma pessoa tem que ir dando voltas constantemente na pergunta <<Sou Cristão?>>; se estiver continuamente ansioso olhando a seu próprio estado e com duvidas de onde se encontra, isto é um obstáculo a sua utilidade. Se quando fala aos pecadores não está seguro se ele não é também deles, não pode exortá-los com confiança e simplicidade que poderia se soubesse que tem seus pés na rocha. É uma idéia predileta de alguns a que é melhor que os santos se achem sempre as escuras com respeito a isso, para que sejam humildes. Isto é como se o filho de Deus tivesse sido calculado para fazer-lhe orgulhoso. Uma das considerações de mais peso no universo para impedi-lo de desonrar a Deus, é saber que é filho de Deus. Quando uma pessoa está em um estado de ansiedade em sua mente, só pode Ter pouca fé, e sua utilidade não pode ser muita até que tenha resolvido esta questão.

III. A praticabilidade deste requerimento.

É uma idéia preferida de alguns que esta pergunta não pode ser respondida com certeza no mundo. É assombroso o número de pessoas que há, que parecem fazer uma virtude das grande dúvidas que têm a respeito se são cristãs. Durante centenas de anos se tem considerado por muitos como uma circunstância suspeitosa, o que um que professa religião não estivesse cheio de dúvidas. Muitos o consideram quase como um sinal certo de que estas pessoas não sabem nada de seu próprio coração. Uma das perguntas que se tem feito aos candidatos à admissão na igreja de modo geral tem sido: <<Tem algumas dúvidas de teu bom estado?>> E se o candidato responde: << Oh, sim tenho grandes dúvidas>>, tudo vai bem, e se toma como evidência de que ele é espiritual, e que conhece a fundo seu próprio coração e tem um alto grau de humildade. Porém, se não tem dúvidas, se toma como evidência de que conhece pouco seu próprio coração e que é muito provável que seja um hipócrita. Em contra disto, eu sustenho que o dever que nos manda este texto é um dever praticável e que os cristãos podem submeter-se a esta prova, saber por eles mesmos e Ter uma segurança satisfatória de seu verdadeiro caráter.

1. Isto é evidente pela ordem do texto:<<Examinai a vocês mesmos para ver se estão na fé; provai a vocês mesmos.>> Crerá alguém que Deus requer que nos examinemos e provemos a nós mesmos e vejamos qual é o nosso verdadeiro caráter, quando se sabe que é impossível que o saibamos?

2. Temos o melhor meio de prova possível, para provarmos a nós mesmos e conhecer nosso caráter e este meio é a consciência, ou seja, o conhecimento que temos de nossas próprias vivências.

A consciência nos dá a maior certeza possível quanto aos modos pelos quais tem de ser determinado nosso caráter, e a grande pergunta pode ser contestada. Qual é nosso estado diante de Deus? Podemos e deveríamos ter a mesma classe de evidência de nosso estado ante Deus que temos de nossa existência. A consciência está constantemente testificando de nossos estados mentais ou vivências e só é necessário que nós tomemos nota do que a consciência testifica, e podemos resolver a questão com tanta certeza como podemos fazê-lo sobre nossa existência.

3. Deus dá aos homens oportunidades constantes de pôr em ação o que está em seus corações, para que nada possa impedi-los de chegar a uma decisão sobre este assunto, a não ser a negligência.

Se os homens estivessem fechados em calabouços, onde não tivessem oportunidades de atuar, e não pudessem ser influenciados pelas circunstâncias, e de modo algum se pudesse desenvolver o estado de seu coração, não se poderia culpar de não conhecer a si mesmo. Porém, Deus os coloca em circunstâncias em que estão nesta vida com o propósito, como disse aos filhos de Israel, de que sejam provados, e possa conhecer o que há em seus corações e se guardam seus mandamentos ou não. As coisas que nos rodeiam devem produzir uma impressão em nossa mente, e conduzir-nos a sentir e atuar de alguma forma. E isto nos proporciona oportunidades de conhecimento próprio, em que vemos o que sentimos e como nos inclinamos a atuar nas circunstâncias tão diversas.

4. Estamos ainda bem qualificados para provar nosso próprio caráter, porque temos uma regra perfeita com que prová-lo.

A lei de Deus é um critério verdadeiro pelo qual podemos provar nosso caráter. Sabemos exatamente o que é, e temos por tanto uma regra invariável e infalível pela que podemos julgarmos a nós mesmos. Podemos trazer nossos sentimentos e ações a esta regra, e compará-los com este estándar, e saber exatamente qual é seu verdadeiro caráter à vista de Deus, pois Deus mesmo os prova pelo mesmo estándar.

5. Nossas circunstâncias são tais que nada pode conduzir-nos a enganarmos a não ser a intenção insincera de fazê-lo.

Indivíduo que se engana a si mesmo não é só descuidado e negligente, senão também fraudulento, do contrário não se enganaria a si mesmo. Deve ter um alto grau de prejuízo pelo orgulho e se cegou a si mesmo, pois do contrário teria que saber que não é o que professa ser. As circunstâncias que requerem o exercício de sua mente são tantas e tão variadas que deve ser uma cegueira voluntária em que devem ter induzido em si mesmos se estão enganados. Se não tivessem oportunidades para que se mostrassem seus sentimentos poderiam ser ignorantes. O que nunca viu um mendigo poderia ser incapaz de dizer quais são seus sentimentos com respeito aos mendigos. Porém, se o colocamos onde há mendigos a cada dia, será um cego voluntário ou insincero se não sabe qual é a resposta de seu coração a respeito de um mendigo.

IV. Vou mencionar algumas coisas com respeito a maneira de executar este dever.

Primeiro: Negativamente.

1. Não se faz esperando que a evidência venha a nós.

Têm muitos que parece que esperam, em uma atitude passiva, com que a evidência chegue neles para saber se são cristãos ou não. Parece que esperam que cheguem certos sentimentos nele. Talvez oram sobre ele; talvez oram sinceramente, e logo que venha o sentimento que os permitiriam ter evidência satisfatória de seu bom estado. Muitas vezes não fazem nada na religião até que obtenham esta evidência, esperam e seguem esperando, numa expectativa inútil, de que o Espírito de Deus venha algum dia e os tirará deste pântano, em que permanecem passivos e inertes. Podem esperar até o dia do juízo e nunca clarearão nada.

2. Não é por alguma intenção direta de forçar os sentimentos num exercício que teremos evidência.

A mente humana está constituída de tal forma que nunca sentiremos se tratarmos de sentir. Pode tentar com tanta determinação como queira, para ver se pode ter um sentimento particular. Teus esforços para fazer aparecer sentimentos são totalmente inúteis e glosóficamente absurdos. Não há dúvida neste momento diante da mente que possa produzir a emoção ou o sentimento. O sentimento deve ser despertado na alma pelo fato da mente se fixar em algum objeto apropriado para produzir sentimentos. Porém, quando a mente está fixa, não sobre o objeto, senão na intenção direta de produzir o sentimento este não aparecerá. É impossível. A atenção tem que ser absorvida por um objeto capaz de produzir sentimento, ou este não aparecerá. Pode fechar os olhos e esperar para ver, ou fazê-lo em um quarto escuro. Em um quarto escuro não tem nenhum objeto capaz de estimular a vista, e qualquer esforço para ver é inútil. Quando a atenção da mente está dirigida para dentro e tenta examinar a natureza da emoção presente, esta emoção deixa de existir no mesmo instante, porque a atenção já não está fixa no objeto que causa a emoção. Ponho minha mão diante desta lâmpada, que projeta uma sombra; porém se tiro a lâmpada, não há sombra. O mesmo pelo que se refere à mente que se aparta do objeto que desperta a emoção; esta deixa de existir. A mente deve estar fixa no objeto, não na emoção, ou não haverá emoção e conseqüentemente não haverá evidência.

3. Nunca conseguirá evidência passando o tempo lamentando-se pelo estado de seu coração.

Alguns passam o tempo em gemidos e queixas. <<Oh, não sinto nada, meu coração é tão duro.>> O que está fazendo? Nada, senão gemer e chorar porque não sente. Talvez tratem de esforçar-se para poder sentir! Isto não tem sentido. É como tentar voar. Enquanto se queixam, gemem e pensam no duro de seu coração, não fazem nada, e o demônio se diverte. Suponhamos que um homem se aparta do fogo e logo se queixa que tem frio; seus próprios filhos vão rir dele. Se ele se afasta do meio de calor, Como não vai esfriar-se? E todas a queixas e lamentações não vão tampouco serem úteis.

Segundo: Positivamente. O que devemos fazer para cumprir este dever?

Se queres provar o verdadeiro estado de seu coração com respeito a qualquer objeto, deve fixar tua atenção neste objeto. Se deseja provar o poder ou o quanto é aguçada que é esta vista deve aplicar esta faculdade ao objeto e logo provar o estado desta faculdade. Se coloque entre objetos para provar tua vista; e entre sons para provar teu ouvido. E quanto mais você fecha os outros sentidos para que os objetos não os estimulem, mais perfeitamente provarás a agudez de sua visão ou a perfeição de seu ouvido. Tem muitas coisas que podem distrair o coração. Quando prestamos atenção a um objeto calculado para despertar sentimento, é impossível não senti-lo. A mente está constituída de tal forma que não pode evitar o sentir. Não é necessário parar e perguntar <<Sinto calor?>> Já se sabe, porque sentimos. Se passar a mão rapidamente diante de um foco de calor a sensação pode ser muito ligeira, quase imperceptível, porém se prestar atenção a notará. Quando a impressão é leve requer maior esforço da atenção para percebê-la. Até mesmo os sentimentos fugazes podem ser tão ligeiros que quase não ocupam nosso pensamento e assim nos passam inadvertidos, porém não é por isso que são menos reais. Mas pondo a mão um minuto junto com a lâmpada ardendo, a sensação se imporá por cima de outras ocupações. Se a mente está fixa em um objeto capaz de estimular emoções de alguma classe, é impossível não sentir as emoções em algum grau; e se a mente está em estado de máxima atenção, é impossível não sentir as emoções num grau tal que nos demos conta de que existem. Estes princípios nos mostrarão como devemos de fazer a prova de nosso caráter, e saber o estado real de nossos sentimentos a qualquer objeto. É fixando a atenção em um objeto até que nossas emoções estejam estimuladas e se façam conscientes.

Vou especificar outra coisa que devemos lembrar. Assegure-se de que as coisas nas quais enfoca tua mente e sobre as quais desejas por em prova o estado de seu coração sejam realidades.

Há uma grande quantidade de religião imaginaria no mundo, que as pessoas afetadas tomam equivocadamente por real. Têm grandes sentimentos, suas mentes estão muito entusiasmadas e o sentimento corresponde ao objeto contemplado. Porém, aqui está a causa do engano: o objeto é imaginário. Não é que o sentimento seja falso ou imaginário. O sentimento é real. Não é que o sentimento não corresponda ao objeto na mente. Corresponde a ele perfeitamente. Mas o objeto é uma ficção. O indivíduo formou para si uma noção de Deus ou de Jesus Cristo, ou da salvação, que está completamente fora da verdade, e seus sentimentos ante estas imaginações são os mesmos que seriam produzidos pelos objetos verdadeiros, se sua religião fora verdadeira, pelo qual se enganam. Aqui há induvidavelmente a maior fonte de esperanças e professões de fé falsas no mundo.

V. Vou agora especificar as poucas coisas nas quais é teu dever provar o estado de sua mente.

1. Pecado: não teu pecado em particular, senão o pecado em geral, com um ultraje, como um ultraje cometido contra Deus.

Não tem que supor que chegarás a conhecer o verdadeiro estado de teu coração meramente descobrindo em tua mente um forte sentimento de desaprovação do pecado. Isto pertence à natureza de um ser inteligente como tal. Todos os seres inteligentes sentem desaprovação do pecado, quando o considera de modo abstrato e sem referência alguma com a própria satisfação egoísta. O demônio, sem dúvida, o sente. O demônio não sente mais aprovação pelo pecado do que Gabriel. Ele culpa aos pecadores, condena sua conduta e sempre que não tem motivos egoístas para sentir prazer pelo que fazem, aborrece o pecado. Nos mesmos malvados na terra você pode encontrar um aborrecimento intenso ao pecado. Não há homem na terra que não condene e aborreça o pecado em abstrato. A mente está constituída assim: o pecado é de modo universal e natural aborrecido pela necessidade da razão e da consciência reta. Todo poder da mente se rebela ante ao pecado. O homem sente prazer nos que cometem iniqüidades só quando têm alguma razão egoísta para desejar que as cometam. Não há nenhum ser racional que aprove o pecado como pecado.

Porém, há uma grande diferença entre a desaprovação do pecado, como algo abstrato, e detestá-lo de coração e se opor ao mesmo, fundamentando isto no amor a Deus. Vou ilustrar a idéia. Uma coisa é que um jovem veja que certo ato é mal, e algo mais o que o considere como um ultraje contra seu pai. Aqui há algo mais acrescentado ao primeiro sentimento. Não só a indignação contra o mal, senão seu amor ao pai que produz um sentimento de agravio misturado com indignação quando o considera cometido contra Deus.

Se queres saber qual é teu sentimento contra o pecado, pergunta-se, pois, Quais são teus sentimentos quando te moves entre pecadores e vês que infringem a lei de Deus? Quando ouve que blasfemam, ou quebrantam o dia do Senhor, ou se embebedam, Quais são teus sentimentos? Sente como o salmista quando escreveu: << Contemplei aos transgressores, e me afligi, porque não guardavam tua palavra.>> Assim que diz: << Rios de águas correram de meus olhos, porque não guardavam tua lei.>> E outra vez: << Horror tem se apoderado de mim, porque os maus tem abandonado tua lei.>>

2. Tem que pôr a prova o estado de seus coração com respeito a seus pecados.

Olhe para trás, a teus pecados passados, lembre de tua conduta de outros tempos, e veja se de um modo claro os condena e os aborrece, e sente o que sentiria uma criança afetuosa quando trata de lembrar que desobedeceu a seu pai. É possível sentir uma forte convicção de pecado com respeito a uma conduta anterior própria que foi um delito ou pecaminosa. Porém, o que é importante é se este sentimento se acompanha das emoções de aflição e pena, por ter desobedecido a Deus. Provavelmente há poucos cristãos que não têm olhado a sua antiga conduta com respeito a seus próprios pais com viva emoção e têm pensado no pai afetuoso ou na mãe amorosa aos quais têm desobedecido e entristecido; e que tem sentido além do mais um sentimento de desaprovação de sua conduta, e de profunda emoção de pena, que os inclinava a chorar e até os forçava a verter lágrimas. Pois bem, este é o verdadeiro arrependimento com respeito aos pais. E o arrependimento a Deus é o mesmo se é genuíno, e corresponderá em grau com a intensidade da atenção com a qual a mente se fixa no objeto.

3. Queira pôr a prova teus sentimentos com respeito aos pecadores impenitentes.

Logo que você vê eles e tem tratos com eles, falando sobre o tema de suas almas, advertíndo-os, do que dizem e do que sentem, coloque-se à corrente do estado real de seus corações, e logo saberá o que você sente com respeito aos impenitentes. Não te feches em teu quarto e tente imaginar a uma pecador impenitente. Podes trazer a tua mente um quadro que afete tuas simpatias e te faça chorar e orar. Nada disso. Ponha teu coração em contato com a realidade viva do pecador, raciocine com ele, exorte-o, vê suas preocupações, sua obstinação, sua insinceridade, ore com ele se possível. Não pode fazer isto sem despertar emoções em tua mente, e se é um cristão, despertará em você emoções misturada com pena, compaixão e indignação, como sente Jesus Cristo e não ficará lugar para dúvidas sobre este ponto. Ponha tua mente em contato com os pecadores, e mantenha-a aí, e presta atenção ao que sente.

4. Queira provar o estado de sua mente com Deus.

Concentre teus pensamentos diretamente em Deus. E não o faças segundo a imaginação de teu próprio coração insensato, senão pegue a bíblia e aprende nela o que é a verdadeira idéia de Deus. Não imagine sua forma, nem aparência, nem seu aspecto, senão ponha tua mente na descrição bíblica ao que sente, faz e diz, e não pode menos que sentir. Aqui você achará o estado real de teu coração. E mais, isto constituirá o estado real de seu coração sobre o qual você não pode confundir-se.

5. Ponha em prova teus sentimentos com respeito a Cristo.

Tem que saber se amas ao Senhor Jesus Cristo ou não. Repasse as circunstâncias de sua vida, e veja se aparecem como realidades em tua mente, seus milagres, seus sofrimentos, seu nobre caráter, sua morte, sua ressurreição, sua ascensão, sua intercessão agora à destra do trono de Deus. Você crê nestas coisas? Estão estas realidades em sua mente? Quais são teus sentimentos à vista delas? Quando pensa em sua boa vontade para salvar, sua morte expiatória, seu poder, se todas estas coisas são realidades para você, terá sentimentos dos quais será consciente, e com respeito aos quais não será possível que te confundas.

6. Quais são teus sentimentos com respeito aos santos?

Se voe quer por a prova teu coração com respeito a este ponto, se ama os santos, não deixe que teus pensamentos viagem para os extremos da terra, senão deixe que tua mente se concentre nos que tem perto e veja se os ama, se desejas sua santificação, se realmente queres que cresçam na graça, se pode levá-los em teu coração ao trono da graça, e pedir a Deus que os abençoe.

7. O mesmo com respeito aos avivamentos.

Se você quer saber o estado de teus sentimentos com respeito aos avivamentos, leia sobre eles, pense neles, fixa tua mente neles, e não pode por menos que ter sentimentos que te darão evidência do estado de seu coração. O mesmo se pode dizer dos pagãos, dos escravos, dos viciados, da bíblia, de qualquer objeto de consideração piedosa. O único modo de conhecer o estado de seu coração é concentrar tua mente na realidade destas coisas, até que sinta tão intensamente que não haja erros possíveis com respeito a natureza de seus sentimentos.

Se você acha alguma dificuldade em conseguir que algum de estes pontos produza sentimentos, é devido a uma entre duas razões, ou bem que tua mente está absorvida por outros aspectos da religião, de modo que não te permite concentrar-se propriamente em algum ponto específico, ou que teus pensamentos divagam soltos por todas as partes. O primeiro ocorre as vezes, e tenho conhecido alguns cristãos que estavam muito aflitos porque não sentiam tão intensamente como acreditavam que deviam, sobre alguns pontos. Como por exemplo, seus próprios pecados. A mente de uma pessoa pode estar tão absorvida pela ansiedade, pelo trabalho e a oração pelos pecadores, que se requer um esforço para pensar bastante sobre o conteúdo de sua própria alma para sentir profundamente, e quando se põe de joelhos para orar por seus próprios pecados, este pecador, com quem a pessoa estava falando antes, se apresenta vivamente em sua mente, de tal forma que ela apenas pode orar por si mesma. Isto não deve ser considerado em contra da pessoa: a razão pela qual não se sente sobre um ponto da religião é porque os sentimentos estão tão absorvidos por outro, de igual importância. Porém, se teus pensamentos divagam por todas as partes, e esta é a razão por não sentir com bastante intensidade qual é teu verdadeiro caráter, se tua mente não se concentra na bíblia e se fixa em algum objeto de sentimento religioso, tenha cuidado de você mesmo e endireite seus pensamentos com mão firme, até que sintas. A pessoa tem controle de seus pensamentos: Deus colocou o controle da mente em sua mão. E desta maneira, tem controle de seus sentimentos, fixando sua atenção no objeto sobre o qual quer sentir. Concentre-se de modo determinado, decidido, sobre este ponto e torrentes de sentimentos brotarão de sua mente, e conhecerás qual é o estado de seu coração e entenderás teu caráter real de acordo com a vista de Deus.

Conclusão

1. A atividade na religião é indispensável para o auto exame.

Um indivíduo não pode conhecer nunca o estado verdadeiro de seu coração a menos que esteja ativo nos deveres religiosos. Se ele fecha-se em seu quarto, nunca poderá dizer quais são seus sentimentos com respeito aos objetos que estão afora, e nunca poderá sentir propriamente sobre eles, até que saia e atue. Como posso saber qual é meu sentimento real aos pecadores, se nunca ponho minha mente em contato com eles? Se você vai ao teu quarto e com a imaginação te fazes sentir sobre eles, não faz nada mais que enganar-se, pois não tem produzido um sentimento verdadeiro, real. Se você quer por a prova a realidade de seus sentimentos aos pecadores saia, adverte aos pecadores e logo você poderá ter a realidade de seus sentimentos manifestada.

2. A menos que uma pessoa ponha a prova seu coração pela realidade das coisas, esta estará constantemente submetida à ilusão, e se enganará de tudo.

Suponha um indivíduo que se fecha enclausurado, aparte da realidade do mundo, vivendo em um mundo de sua imaginação. Passa a ser uma criatura perfeita de imaginação. O mesmo ocorre na religião com os que não põem sua mente em contato com a realidade. Estas pessoas acreditam que amam a humanidade, porém não os faz nenhum bem. Imaginam que aborrecem o pecado e não fazem nada para destruí-lo. Quantas pessoas enganam a si mesmas por um entusiasmo da imaginação exercida, por exemplo, sobre as missões; quanto comum é que haja pessoas que põem uma grande quantidade de sentimento, e celebram reuniões de oração pelas missões, porém realmente não fazem nada para salvar almas. Uma mulher pode passar o dia todo indo de uma reunião de oração à outra para orar pela conversão do mundo, enquanto que seu marido impenitente está com ela na cozinha e não o diz uma palavra dirigida para salvar sua alma o dia todo o talvez todo o mês. Há pessoas que se levantam em reuniões públicas e falam de seu sentimento pelos pagãos e não fazem o menor esforço direto para salvar os pecadores que os rodeiam. Este é o resultado da imaginação. Não há realidade nesta religião. Se tivessem amor real por Deus, amor pelas almas e piedade real, os quadros remotos dos pagãos pintados pela imaginação não criariam mais sentimentos nele que a realidade que os rodeia.

Não serve dizer que isto é porque sua atenção não está voltada para os pecadores que os rodeiam. Ouvem proferir blasfêmias, e vêem que se quebranta o dia de repouso e outros vícios, e a realidade desnuda está diante de seus olhos, um dia após o outro. E se isto não produz sentimentos neles, é em vão fazer ver que sintam o que Deus requer com respeito aos pecadores de países de onde seja. E mais, se tomarmos estes indivíduos agora estão cheios de sentimentos pelos pagãos – transportando-os às Ilhas dos Amigos, ou a qualquer outro lugar, fora de sua imaginação e em meio da crua realidade do paganismo, todo este sentimento profundo desaparece. Podem escrever cartas cheias das abominações dos pagãos, e coisas assim, porém seus sentimentos com respeito a sua salvação desapareceu. Se pode ouvir falar sobre os pagãos de pessoas que nunca tenham convertido uma alma em casa; não cabe dúvida que tudo isto é imaginação. Se não estimulam e fomentam os avivamentos em casa, onde entendem a linguagem e têm acesso direto a seus vizinhos, muito menos se pode contar que fariam algo da obra real para a religião em território pagão. As igrejas teriam que entender isto, e pensar nele quando selecionam homens para as missões estrangeiras. Têm que saber que se a realidade desnuda não estimula a pessoa para a ação, o diabo vai rir do que fariam um milhão desses missionários.

O mesmo engano se manifesta com respeito aos avivamentos. Há indivíduos que são muito amigos dos avivamentos. Porém notemos bem, sempre são amigos dos avivamentos em tempos passados, os avivamentos abstratos, os remotos ou futuros. Porém com respeito aos avivamentos presentes, sempre se encontram reservados ou duvidosos. Podem ler de avivamentos dos dias do Presidente Edwards, ou na Escócia, ou no País de Gales, se entusiasmam extraordinariamente e se deleitam. Podem orar: << Senhor, aviva tua obra; Oh, Senhor, dá-nos estes avivamentos, um novo pentecostes, em que se convertam milhares em um dia.>> Porém, coloque-os na realidade das coisas, e nunca há um avivamento que desperte neles o menor interesse, ou os satisfazem. São amigos das ficções imaginárias de sua mente; podem criar um estado de coisas que estimule seus sentimentos, porém a realidade crua não os põem em uma atitude de cooperação e de ajuda real no avivamento.

Nos dias do nosso Senhor, as pessoas diziam que aborreciam os feitos daqueles que haviam perseguido os profetas, e sem dúvida criam. Diziam: <<Se houvéssemos estado nos dias de nossos pais não haveríamos sido participantes com eles do derramamento de sangue dos profetas.>> Não há dúvida que se maravilhavam de que haviam feito aquelas coisas. Nunca haviam visto um profeta; movia a imaginação deles, simplesmente. E tão pronto como apareceu o Senhor Jesus Cristo, o maior dos profetas, na qual se centram todas as profecias, o rejeitaram e finalmente lhe deram a morte, com tanta crueldade como haviam mostrados seus pais quando haviam matado um profeta. << Enchei a medida de vossos pais – os dizia nosso Salvador -, que sobre vocês possa vir todo o sangue justo derramado sobre a terra.>>

A humanidade sempre tem se enamorado dos produtos da imaginação, desde todos os tempos e tem tropeçado com eles e dado de cabeça no inferno. Olhe aos Universalistas. Imaginam que Deus vai salvar a todo o mundo, em todos os casos, e que haverá um céu que acomodará a todos; e logo que amam a este deus que fizeram, e o céu que imaginaram e talvez até choram de amor. Seus sentimentos são às vezes profundos, porém são ilusórios, porque são excitados pela imaginação e não pela verdade.

3. Quanto mais sai um indivíduo de si mesmo e faz coisas que não pertencem a ele, o tema de seu pensamento, mais piedade terá, e mais se evidenciará esta piedade.

A religião consiste no amor, no sentimento reto e em fazer o reto, ou seja, o bom. Se, portanto você deseja ter muita piedade, não pense que vai tê-la cultivando-a em formas que não façam crescer esta piedade; isto é, retirando-te a um claustro e apartando-te de todo contato com a humanidade. Se o Senhor Jesus Cristo houvesse considerado que estas circunstâncias eram favoráveis para a piedade, nos haveria dito que o fizéssemos. Porém, Ele não pensava assim. Portanto, planejou nossas circunstâncias tais como são, de modo que seu povo possa ter mil oportunidades de exercer benevolência, de fazer o bem. E se saímos de nós mesmos e voltamos de coração a estas coisas, não podemos por menos que crescer na piedade e ter evidência de que cresce de modo satisfatório.

4. É só no aspecto do autoexame que podemos fechar-nos sistematicamente em nosso quarto para executar nosso dever; isto é, quando queremos olhar para trás e examinar com calma os motivos de nossa conduta passada. Nestes casos é freqüentemente necessário abstrair nossos pensamentos e manter outras coisas fora de nossa mente para voltar a mente às coisas que temos feito e os motivos pelos quais temos obrado. Para fazer isto de modo efetivo é necessário, com freqüência, recorrer ao retiro, ao jejum e à oração. As vezes é impossível despertar lembranças vivas do que desejamos examinar sem recorrer às leis da associação que venha a ajudar-nos. Tentamos lembrar cenas passadas, e tudo parece confuso e às escuras, até que damos com uma idéia associada e gradualmente nos apresenta a coisa fresca e recente adiante. Suponhamos que me chamem como testemunha no tribunal com respeito a um incidente. Com freqüência posso conseguir uma lembrança e então se aparecem todas as circunstâncias como se tivesse ocorrido ontem. E assim achamos que ocorre com respeito ao exame a alguma parte de nossa própria vida, que não virá por mais que nos fechemos em nós mesmos, nem meditando, nem orando, nem jejuando até que nos ponhamos em algumas circunstâncias que despertem as idéias associadas e com elas os sentimentos que previamente havíamos tido.

Suponhamos um ministro que deseja lembrar e considerar seus sentimentos e o espírito com que havia pregado há anos. Deseja saber quanta piedade real havia em seus labores. Poderá conseguir muito em seu quarto de joelhos, por meio da ajuda da forte influência do Espírito de Deus. Porém, obterá um resultado muito mais efetivo indo ao lugar e pregando ali outra vez. A atitude exata que havia em sua mente pode reaparecer e estar diante de sua mente como uma firme realidade.

5. Ao examinar a si mesmo tenha cuidado de evitar o esperar achar todas as graças do cristão no exercício de sua mente num instante.

Isto é contrário a natureza da mente. Tem que dar-te por satisfeito se você acha que a atividade de tua mente é reta, sobre o tema que está considerando. Se tem sentimentos inapropriados naquele momento, isto é outra coisa. Porém, se você acha que as emoções naquele momento são as devidas, não tire uma inferência equivocada porque você não encontra alguma emoção reta que você esperava que estivesse presente. A mente está constituída de tal forma que só pode ter uma série de emoções ao mesmo tempo.

6. Disto se pode compreender por que as pessoas, com freqüência, não sentem mais do que sentem.

Seguem um curso não que é apropriado para produzir sentimento. Sentem, porém não sobre o apropriado. A humanidade sempre sente sobre alguns pontos; e a razão pela que não sentem mais profundamente sobre temas religiosos é porque sua atenção não está profundamente fixa nestes temas.

7. Aqui se vê a razão pela qual tem uma diversidade tão estranha nas atividades dos cristãos reais.

Há cristãos cujos sentimentos, quando têm sentimentos, são sempre de caráter alegre e contente. Há outros cujos sentimentos são sempre tristes e deprimentes. Há os que seus pensamentos estão dirigidos a objetos diferentes. Uma classe está sempre pensando em objetos que os fazem sentir felizes; outros pensam no estado da igreja, no estado dos pecadores, e isto pesa sobre eles como uma carga, como se houvesse uma montanha sobre seus ombros. Ambos são religiosos, os sentimentos são retos, considerando os objetos que embargam sua atenção. O apóstolo Paulo sentia continuamente aflição em seu espírito em conseqüência de seus irmãos. Não há dúvida que estava bem. O caso de seus irmãos que haviam rejeitado ao Salvador pesava tanto em seu pensamento, a sentença que colocava sobre sua cabeça, estava constantemente em sua mente, Como podia deixar de sentir o peso?

8. Observe a influência destas duas classes na utilidade dos indivíduos.

Se consideramos um cristão muito gozoso e feliz, veremos que geralmente não é um cristão muito útil. Pelo comum, estes estão se deleitando no doce da religião, porém não fazem muito. Se acham ministros que predicam muito sobre estes temas, e fazem a seus piedosos ouvintes muito felizes no religioso, porém estes ministros raramente são instrumentos para a conversão de muitos pecadores, por mais que sejam um refrigério e edifiquem aos santos. Por outro lado, achamos a homens que estão profundamente saturados de agonia na alma, considerando o estado dos pecadores e estes são instrumentos na conversão de outros. A razão é evidente. Os dois predicam a verdade, os dois predicam o evangelho, em diferentes proporções, e os sentimentos que despertam correspondem aos pontos de vista desde os que predicam. A diferença é que o primeiro colabora com os santos e o outro converte os pecadores.

Se pode ver uma classe de pessoas que professam religião que sempre estão contentes e que são agradáveis e amáveis como companheiros, mas que raramente se ocupam de arrancar os pecadores do fogo. Achamos a outros que estão agonizando pelos pecadores, considerando seu estado e suspirando por converter almas. Em vez de gozar de antemão o céu já na terra, simpatizam com o Filho de Deus quando estava na terra e gemem em seu espírito passando toda a noite em oração.

9. O verdadeiro espírito de avivamento é um espírito de desejo agonizante e oração pelos pecadores.

10. Aqui se vê como se explicam teus próprios sentimentos em ocasiões diferentes. As pessoas se perguntam às vezes por que sentem o que sentem. A resposta é clara. Sentem assim porque pensam assim. Se diriges tua atenção a certos objetos terás os sentimentos que são produzidos por estes pensamentos.

11. Se vê também porque os sentimentos de algumas pessoas são tão cambiáveis.

Há muitos cujos sentimentos estão sempre mudando e são variáveis. É porque seus pensamentos não estão fixos. Se prestassem atenção e fixassem seus pensamentos, seus sentimentos seriam regulados.

12. Se vê a maneira de engendrar qualquer estado de felicidade desejado em sua mente, e como engendrar algum estado desejado nos sentimentos de outros.

Ponha teus pensamentos num tema que seja apropriado para produzir estes sentimentos e limita-se a eles, e os sentimentos se produziram sem falha.

13. Há multidões de pessoas piedosas que desonram a religião com suas dúvidas.

Estão perpetuamente falando de suas dúvidas, e chegam a conclusão precipitada de que não têm religião. Em tanto que, se, em vez de fomentar e permanecer em suas dúvidas pusessem sua mente sobre outros temas, em Cristo por exemplo, e saíssem a buscar pecadores e tratassem de levá-los ao arrependimento, pode-se afirmar que seus sentimentos seriam retos, e se dissipariam suas dúvidas.

Lembre-se de que não tem que esperar ter os sentimentos necessários para fazê-lo. Talvez alguma das coisas que tenho dito não tenham sido entendidas propriamente. Não se tire a inferência que tem que permanecer quieto e não fazer nada até que esteja convencido de que se sente o que se deve. Coloque-se nas circunstâncias que te farão sentir de modo apropriado e coloque-se a trabalhar. Por uma parte, a agitação e a ansiedade sem sentimentos não te serve para nada, e por outra, o fechar-se no quarto e esperar que venham os sentimentos tampouco te serve para nada. Tem que entrar em atividade e permanecer ativo. De outro modo nunca vai ter os sentimentos apropriados. E logo mantenha tua mente constantemente baixo a influência dos objetos que são apropriados para criar e manter vivos os sentimentos cristãos.

Notas:  Artigos Práticos sobre o Cristianismo – Art. XI 1836 –17 Julho, 1844

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