Há para ti GRAÇA NO DESERTO
Jeremias foi um profeta que falou dos juízos de Deus, um profeta triste, que se dirigiu a um povo que havia pecado tanto ao ponto de ser levado em cativeiro. A espada estava para cair sobre eles e só um remanescente voltaria. Contudo, dentro dessa mensagem sombria, ardia uma luz de esperança, e no capítulo 31, verso 2, veio a promessa de que o “povo que escapou da espada achou graça no deserto”.
Graça no deserto! Que palavra foi esta para eles e é também para nós hoje.
Num tempo de pecado e juízo o povo era lembrado de como tempos atrás, havia escapado à espada de Faraó, para achar graça de Deus no deserto. Assim também, a última palavra de Deus seria sempre uma palavra de graça. É a respeito desta graça que precisamos aprender hoje.
A natureza do deserto
“O lugar é deserto e a hora é já avançada”, disseram os discípulos ao Senhor certa vez. Quão verdadeiro é isto a respeito do mundo em que vivemos. Para os não-crentes o mundo é como uma cidade cheia de farturas, mas para o crente é como um deserto que tem que atravessar em direção a terra prometida, pois muito pouco há nele que realmente dê prazer ao seu coração ou refrigere o seu espírito. É antes um lugar de vazio e sequidão, como o era o deserto para o povo de Israel quando saiu do Egito. Não seria a isto que se referia o salmista quando exclamou: “como o cervo brama pelas correntes das águas, assim suspira a minha alma por ti, ó Deus!” “A minha carne te deseja muito, em uma terra seca e cansada, onde não a água?” Há uma sequidão espiritual neste mundo, que é o resultado inevitável de sua separação de Deus, sequidão a que nós mesmos somos sujeitos, desde que somos também parte desta criação caída.
Há perigos no deserto. Deuteronômio capítulo 8 o descreve como um “grande e terrível deserto de serpentes ardentes e de escorpiões”. A vida é cheia de perigos espirituais, pois este é um mundo em que satanás anda em derredor buscando a quem possa tragar, onde a tentação espreita a cada esquina. O Senhor Jesus conheceu os perigos do deserto. Para Ele foi um lugar de grande tentação e não fosse a graça do Senhor, nenhum de nós o poderia suportar nem por um momento.
No deserto há também solidão, que por sua vez costuma trazer consigo insegurança, perplexidade e angustia. Quão bem o Salmo 107:4 descreve isto – “andaram desgarrados pelo deserto, por caminhos solitários; não acharam cidade que habitassem. Famintos e sedentos, a sua alma neles desfalecia. Um lugar solitário! Quantos há que vivem ali! Quantos vagueiam em confusão sem achar descanso para suas almas! Para eles a vida é cheia de insegurança, tão confusa e sem esperança como um ermo sem caminho. Aliás, esta pode ser exatamente a condição de alguém que lê estas linhas. Quão necessitado estás de graça no deserto!
A graça que achamos no deserto
Esta é exatamente a situação em que Deus pode revelar-se como aquele que vem ao encontro da nossa necessidade. Enquanto estamos no Egito dos nossos pecados, Ele nos livra pelo poder da morte de Cristo, que Se entregou de uma vez para sempre na cruz; mas ao jornadearmos pelo deserto da vida, Ele nos vem assistir continuamente por Sua graça diária e o poder de Cristo ressuscitado.
Graça não é alguma força misteriosa transmitida magicamente ou mecanicamente. Conquanto os oito primeiros capítulos de Deuteronômio de muitos detalhes desta graça no deserto, quando reduzida a seu ponto de partida é simplesmente que o “Senhor teu Deus esteve contigo” (2:7). Estes capítulos, tão cheios das atividades de Deus, mostram que supremamente foi a Ele que eles encontraram no deserto. “Andavas após mim no deserto”, lemos em Jr. 2:2.
Somos muito prontos a pensar em graça como alguma coisa a parte de Deus, alguma qualidade como humildade ou poder, quando realmente é o Senhor mesmo, operando por nós, em nós e através de nós. É Deus salvando, falando, guiando, transformando. Na situação de vazio, sequidão, desolação e necessidade, aquele povo achou a Deus mesmo. Eles conheceram Sua presença, enquanto falava com eles, provia as suas necessidades, operava milagres e ia adiante deles para achar-lhes lugar de descanso. Para usar Sua própria expressão, “levou-os sobre asas de águias e os trouxe a Si mesmo” Ex. 19:4.
Quando falamos em graça, queremos dizer Deus mesmo ativo em favor dos pecadores. Graça era Deus em Cristo entrando neste mundo para tratar com a nossa condição e relação erradas. Graça é Deus, o Espírito Santo, vindo para habitar na igreja e trabalhar no mundo.
O propósito do deserto
O capitulo oito de Deuteronômio nos diz que Deus guiou Seu povo no deserto para o provar, “para saber o que estava no seu coração”. Foi-lhes de fato permitido passar por uma situação de necessidade para que pudessem ser provados plenamente.
Nós precisamos ser provados, pois nenhum de nós conhece realmente o seu próprio coração e é só na experiência da vida que o descobrimos. O deserto nos mostra quão indignos somos, pois é no tempo da prova que ficamos conhecendo nossas murmurações, mau temperamento e incredulidade, à Sua verdadeira luz. É o deserto que prova se a nossa fé é rasa ou profunda e se estamos inteiramente entregues ao Senhor ou não. Foi no deserto que Israel falhou e caiu.
Não devemos ter medo da prova. É só o artigo testado que merece confiança, só a pessoa provada que é apta a responsabilidades. É a fé provada que suporta o fogo e a igreja provada é que é útil e forte. Portanto devemos alegrar-nos com as provas, bendizer as situações de necessidade e mesmo regozijar-nos em tribulações, pois assim somos temperados e provados, até que, como o aço flexível, aprendemos a curvar-nos sob a torção, sem nos quebrarmos aos pedaços.
Não só Deus provou o povo no deserto, mas eles provaram o Senhor, pois enquanto descobriram o fracasso que eles mesmos eram, descobriram também que Deus nunca falhava. Aprenderam viver “não só de pão, mas de tudo o que sai da boca de Deus”. Aprenderam, com efeito, a depender de Deus, a crer no que Ele dizia, a pô-Lo a prova e achá-Lo verdadeiro. Nenhuma vez sequer Deus falhou, mas foi preciso o deserto para provar-lhes isto. Então por 40 anos nada lhes faltou, pois que nos lugares vazios e perigosos descobriram numa situação após outra, que Deus era poderoso para vir ao encontro de sua necessidade.
Como mais podemos conhecer a Deus do que provando Sua graça no deserto? O mundo, com todo o seu avanço material e engenho técnico está ainda confuso com tremendos problemas, cuja resposta só se encontra na esfera espiritual, enquanto que milhões de nós que somos crentes provamos a Deus, como uma realidade viva que dá sentido a nossas vidas, porque Ele mesmo é o seu fundamento e o seu alvo. Nós, nesta vida moderna, precisamos tanto de Deus como os do passado, e Ele ainda está aqui para ser provado.
As vezes vagueamos pelo deserto por causa de nossa própria loucura e pecado. Pode ser que em algum ponto nos tenhamos afastado de Deus, apenas para experimentarmos secura e desolação. Contudo, tal é Sua graça, que mesmo ao O encontramos à nossa espera, para falar com amor ao nosso coração, para abrir-nos, mesmo no vale de nossa aflição, uma porta de esperança (Os. 2:14).
A graça transforma o deserto
Para Israel o deserto estava sempre ali, mas tornou-se um lugar onde Deus era achado e isto o transformou, completamente. Graça no deserto significava maná todas as manhãs, um rio que os seguia da rocha ferida, uma coluna de fogo e de nuvem à noite e de dia, uma serpente de metal para sua cura e a arca de Deus para guiá-los no caminho.
Deus transforma o quadro do deserto. Como a esposa nos Cantares de Salomão, podemos subir do deserto encostados em nosso Amado, a Quem descobrimos ali, de modo que cantamos como nos dias de nossa mocidade.
O Deus de graça é o Deus de perdão, que Se deleita em restaurar o que se havia perdido e em fazer novas todas as coisas. Aquele que mudou Jacó em Israel e Simão em Pedro, que fez de Maria Madalena um de Seus santos e de Saulo de Tarso o grande apóstolo, pode dar ornamento por cinza, óleo de louvor por espírito angustiado, cânticos na noite, luz ao entardecer e graça no deserto. Se é esta a tua necessidade, Ele o pode fazer para ti.