Perseverança

Perseverança certamente não é uma palavra alegre, nem tampouco uma palavra popular; contudo é uma palavra essencial para o vocabulário do cristão. Perseverança e sofrimento são quase inevitavelmente interligados. Na mente ocidental, o sofrimento é automaticamente um mal e deve ser eliminado prontamente. Por isto achamos difícil aceitar a idéia que um pouco de sofrimento, seja físico ou emocional, pode até mesmo fazer bem para nós. Talvez um dos sinais do reino dos céus entre nós será uma redução drástica no nosso uso de comprimidos para mal-estares relativamente pequenos como dores de cabeça ou resfriados.

O sistema de Previdência Social tem feito muito bem para a sociedade em geral, e eu, pelo menos, não fico sonhando sobre os bons tempos do passado. O maior perigo, entretanto, é a tendência de produzir uma sociedade dependente que sempre espera que o governo resolva as inconveniências da vida.

Somos tão preocupados com nossa felicidade que qualquer coisa que chega a ameaçá-la deve ser resistida a todo custo, mesmo que acabamos ganhando uma úlcera como resultado. Ninguém precisa de perseverança para a felicidade e, sendo assim, nunca aprendemos a perseverar. Às vezes fico me perguntando quanto tempo perdemos suplicando para que Deus nos tire das circunstâncias desagradáveis que ele enviou para nos abençoar.

Há três espécies de perseverança que precisamos examinar. Primeira: aceitação passiva, segunda: rendição, e terceira: confiança ativa. Das três a segunda é a mais perigosa. Produz hipocondríacos cristãos que se tornam depósitos de lixo para tudo que Satanás quiser lançar neles. É triste reconhecer que há algumas filosofias cristas que interpretam esse tipo de rendição como espiritualidade. Esta é uma reversão dos antigos estóicos, dos quais talvez Simão Estilotes seja o mais bem conhecido. Simão passou uma grande parte da sua vida empoleirado desconfortavelmente em cima de uma estaca, como um ato de rendição. Dizem que as pessoas colhiam até mesmo os piolhos que caíam do seu corpo como relíquias religiosas. Deus não nos chama nem para nos render ao sofrimento nem para procurá-lo, muito menos infligi-lo sobre nós mesmos. Rendição pode ter aparência de espiritualidade e santificação, mas na realidade é exatamente o contrário aos olhos de Deus. Leva inevitavelmente à justiça própria por um lado, ou, por outro, a uma depressão espiritual que mata a iniciativa e nos torna surdos à voz profética de Deus.

Aceitação passiva, na verdade, não é muito melhor do que rendição. Isso pode ser ilustrado melhor se examinarmos o assunto da cura divina. É muito evidente que nem todos os doentes (e alguns diriam muito poucos) são curados. Isto era verdade na época dos evangelhos da mesma forma que o é hoje. Há muitas razões por que isso ocorre, mas eu gostaria de sugerir que muitos outros seriam curados de suas doenças se pudessem simplesmente se livrar da passiva aceitação de enfermidade em seus corpos. Não precisamos negar o fato que muitos têm-se encontrado com Deus no meio da doença ou através dela, mas isto não faz do mal um bem. O verdadeiro perigo da aceitação passiva do sofrimento é que ela embota o nosso discernimento. É muito claro nas Escrituras que algumas coisas devem ser suportadas e outras resistidas. A chave real para a questão está no fato de que algumas coisas, como por exemplo, a tentação, devem ser suportadas e resistidas ao mesmo tempo.

Confiança ativa em Deus é o único fundamento seguro no qual a verdadeira perseverança cristã pode ser edificada. Paulo diz: “E gloriamo-nos (não é bom que fomos incluídos?) na esperança da glória de Deus. E não somente isto, mas também nos gloriamos nas próprias tribulações, sabendo que a tribulação produz perseverança; e a perseverança, experiência; e a experiência, esperança. Ora, a esperança não confunde…” (Rm 5:2-5). Eis aí o âmago da questão. Você pode observar que ele começou e terminou com esperança.

Perseverança não é um fim em si mesmo, é simplesmente a esperança sendo testada. De certa forma esta é a dor da perseverança ­ Deus colocou-nos uma esperança que simplesmente não desaparece e em seguida encontramo-nos em circunstâncias que contradizem quase por completo essa esperança.

Temos um conceito muito idealista dos homens e mulheres da história que mantiveram uma viva esperança através da perseverança. Sem dúvida você já leu sobre a paciência de Jó; no entanto, apesar do registro das Escrituras pensamos, de alguma forma, que Jó nunca se queixou nem perdeu seu senso de direção. A coisa vital que devemos aprender com Jó é que ele perseverou, não que ele atingiu a perfeição. Ele amaldiçoou o dia em que nasceu. Ele disse: “Queixar-me-ei na amargura da minha alma… Se pequei, que mal te fiz a ti, ó Espreitador dos homens? Por que te fizeste de mim um alvo?” (Jó 7:11,20).

Perseverança não se encontra numa vida de sossego; é fundida nas fornalhas de amargura e da confusão. É cultivada no coração honesto que ousa questionar e dar a Deus acesso à sua dor e seu senso de abandono. Deus não exige que você persevere com um sorriso angélico em seu rosto e sem interrogações no seu coração. Simplesmente pede que depois de expressar toda a amargura e desapontamento, você persevere como quem viu a esperança e não a abandonará.

Estou certo que você já descobriu que a vida cristã inclui uma boa porção de provações. Não sei por que tais provações sempre nos surpreendem. Alguns escritores do Novo Testamento nos diriam que devemos esperar as provas e mesmo nos regozijar nelas!

Talvez isso seja exigir demais! Com toda seriedade, porém, é aqui que o inimigo ganha a primeira partida. Ele entra antes de tomarmos consciência. Ele sempre nos ataca de surpresa. Precisamos de alguns princípios práticos para ajudar-nos a perseverar. Não se precipite em aceitar as circunstâncias como inevitáveis. Às vezes suportamos situações porque não tivemos a coragem para mudá-las e nem as nossas atitudes. Lembro-me como aconselhei uma amiga e que aprendesse a empurrar-se entre as pessoas para entrar num ônibus ao invés de passivamente deixá-lo ir embora.

Lembre daquilo que Deus já disse e coloque todas as provações atuais no contexto da sua história com Deus. As provações têm uma tendência de suprimir a nossa percepção da presença de Deus e produzir uma depressão, a qual, se permitirmos, irá apagar toda a sua bondade e misericórdia que tem-nos acompanhado durante nossa vida. É importante neste tipo de depressão que confessemos verbalmente a sua fidelidade e a sua presença.

Muitos de nós têm um hábito de não amolar os outros com os nossos problemas ­ isto chama-se independência, e não o recomendamos. Deus nos uniu ao seu povo e precisamos aprender a apreciar a disposição que há para compartilhar as cargas uns dos outros. Nossos amigos podem também ajudar-nos a colocar tudo no contexto próprio. Fomos chamados para a perseverança, mas não para caminhar sozinho.

Finalmente, não desista. Há um segredo muito simples para ganhar a batalha ­ ou você está em pé ou está se levantando. Como alguém disse em certo lugar: O justo pode cair sete vezes num dia, mas ele sempre se levantará.

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